quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Balão Cor de Rosa

Como qualquer  — ou quase qualquer  — típica paulistana, Julia torrava ao sol do meio-dia enquanto seu marido, João, a alguns metros, revezava seus olhares entre o isopor de cervejas geladas e o desfile de bundas seminuas. Carlinhos, por sua vez, corria do pai para a mãe e da mãe para o pai em busca de atenção.

Sem sucesso, resolveu entediar-se na solitária construção de um belo — mas nem tanto — castelo de areia.

— Balão! Balãozinho! Balão! — grita um senhor de meia idade andando preguiçosamente pela praia vendendo coloridos balões de gás.
— Papai, eu quero um balão!
— Pede para sua mãe! — responde o pai sem parar de olhar a bunda grande e cheia de celulites da morena que passava. Celulites essas que, obviamente, passaram desapercebidas aos olhos de João.

Carlinhos corre e se abaixa para falar com sua mãe:

— Mamãe, eu quero um balão!
— Pede para o seu pai!

Irritado, Carlinhos volta para o seu pai:

— A mamãe disse para você pegar o dinheiro da carteira de couro dela e comprar um balão!

Sem indagações, João grita para o homem dos balões:

— Amigão! Mê vê um balão aqui pro meu menino!
— É pra já! Pode escolher meu jovem!

Carlinhos olha para o emaranhado de balões muito além de sua cabeça e aponta:

— Aquele!
— Esse azul?
— Não! Do lado!
— O verde!
— Não! — irritado — Aquele!
— O... cor de rosa? — indaga timidamente o homem dos balões.
— Sim! — sorri.
— Cor de rosa, meu filho? Cor de rosa é cor de menina! Me vê o azul!
— Azul eu não quero!
— E o verde? Olha como é bonito! Me vê o verde então, amigão!

Carlinhos desiste da discussão senta na areia e cruza os braços. Seu pai pega o balão verde e dá para o menino, que o pega sem o menor interesse. Minutos depois o balão sai voando pelo ar, mas Carlinhos não se importa e volta para seu entediante castelinho de areia.

O dia na praia acabou.

A noite durante o jantar, os três comiam silenciosamente. Julia jazia sentada como se estivesse empalhada devido a insolação conquistada com seu dia de sol e João assistia o futebol.

— Posso sair da mesa? — indagou o menino
— Termina de comer primeiro! – retrucou o pai
— Mas eu já terminei de comer!
— E essa salada no seu prato? Não vai comer não?
— É beterraba!
— E daí?
— E daí que beterraba é cor de rosa e cor de rosa é cor de menina!


E saiu da mesa.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Animus Muro Anima

Estranho Muro Natural
Diferente Muro Igual
Certo Muro Imoral
Muro Muro Muro
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Encontrei uma Porta

domingo, 29 de setembro de 2013

Passarinho Verde

Embora educada, Ana nunca fora considerada uma grande simpatia, não que fosse antipática, mas não se interessava por grandes integrações sociais, nunca participava das festas e nem dos happy hours e, por isso, era sempre o assunto desses eventos. Chegava todos os dias em seu trabalho e por educação dava um breve “Bom dia” aos seus companheiros de trabalho e começava a trabalhar. Sempre muito técnica, se envolvia com seus projetos analíticos e não conversava com ninguém, somente se fosse extremamente necessário. Seus companheiros de trabalho achavam-na estranha e em conversas paralelas sempre chegavam à conclusão de que Ana não era normal.


Certo dia, ao chegar ao escritório, Ana cumprimentou seus companheiros de trabalho com o costumeiro “Bom dia” e deu um rápido sorriso. Seus companheiros se entreolhavam e acharam estranha sua atitude e entre um cochicho e outro, Ana ouvia em meio ao barulho do departamento.

— O que aconteceu com ela? — indagou o curioso

— Não sei, mas ela está diferente, parece até mais bonita — retrucou o cafajeste

— Deve ter visto um passarinho verde — arrematou a indiscreta falando mais alto que todos.

Todos riram e Ana ouviu, corou e nada disse.

No dia seguinte, Ana sorriu ao dizer bom dia e ainda cantarolou durante o expediente.

— Esse tal passarinho verde deve ser um gato! — gritou a indiscreta

Todos riram e Ana ouviu, corou e nada disse.

No outro dia, Ana sorriu ao dizer bom dia, cantarolou durante o expediente e ainda penetrou em algumas conversas paralelas.

— Esse tal passarinho deve um espetáculo — gritou mais uma vez a indiscreta

E os dias se passaram, Ana permanecia diferente e os comentários continuavam, até que um dia, Ana chegou ao escritório mais radiante do que o nunca. Sorriu ao dizer bom dia, cantarolou durante o expediente, penetrou em algumas conversas paralelas e ainda chamou seus companheiros para tomarem uma cerveja.  

A corajosa, que não se aguentava ,falou dessa vez mais alto do que nunca:

— Mas esse passarinho verde deve ser, alto, loiro, bonito e rico!

Antes de todos começarem a rir, Ana ouviu, corou e disse:

— Melhor! Descobri que o tal do passarinho verde nada mais é que um urubu preto, feio e sem a menor graça.

Todos ouviram, coraram e nada disseram.


E depois disso, Ana nunca mais ouviu nenhum comentário aviário.

Vamos?

Vamos?

Deixa estar
Deixa a vida levar
Deixa e vamos!

No final..
Quando a gente chegar a algum lugar...

Ou

Quando a gente não chegar a lugar algum
A gente vê o que faz


Mas fomos...