segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Os Olhares

Ora! Não condene meu olhar! Meus olhos, semelhantes aos seus, são indepententes. Cheios de ímpeto e opnião. Envolvem-se, encantam-se, apaixonam-se. Ora! Não condene meu olhar! Ele, semelhante ao seu, habita a mesma curiosidade que o seu te assusta...

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Balão Cor de Rosa

Como qualquer  — ou quase qualquer  — típica paulistana, Julia torrava ao sol do meio-dia enquanto seu marido, João, a alguns metros, revezava seus olhares entre o isopor de cervejas geladas e o desfile de bundas seminuas. Carlinhos, por sua vez, corria do pai para a mãe e da mãe para o pai em busca de atenção.

Sem sucesso, resolveu entediar-se na solitária construção de um belo — mas nem tanto — castelo de areia.

— Balão! Balãozinho! Balão! — grita um senhor de meia idade andando preguiçosamente pela praia vendendo coloridos balões de gás.
— Papai, eu quero um balão!
— Pede para sua mãe! — responde o pai sem parar de olhar a bunda grande e cheia de celulites da morena que passava. Celulites essas que, obviamente, passaram desapercebidas aos olhos de João.

Carlinhos corre e se abaixa para falar com sua mãe:

— Mamãe, eu quero um balão!
— Pede para o seu pai!

Irritado, Carlinhos volta para o seu pai:

— A mamãe disse para você pegar o dinheiro da carteira de couro dela e comprar um balão!

Sem indagações, João grita para o homem dos balões:

— Amigão! Mê vê um balão aqui pro meu menino!
— É pra já! Pode escolher meu jovem!

Carlinhos olha para o emaranhado de balões muito além de sua cabeça e aponta:

— Aquele!
— Esse azul?
— Não! Do lado!
— O verde!
— Não! — irritado — Aquele!
— O... cor de rosa? — indaga timidamente o homem dos balões.
— Sim! — sorri.
— Cor de rosa, meu filho? Cor de rosa é cor de menina! Me vê o azul!
— Azul eu não quero!
— E o verde? Olha como é bonito! Me vê o verde então, amigão!

Carlinhos desiste da discussão senta na areia e cruza os braços. Seu pai pega o balão verde e dá para o menino, que o pega sem o menor interesse. Minutos depois o balão sai voando pelo ar, mas Carlinhos não se importa e volta para seu entediante castelinho de areia.

O dia na praia acabou.

A noite durante o jantar, os três comiam silenciosamente. Julia jazia sentada como se estivesse empalhada devido a insolação conquistada com seu dia de sol e João assistia o futebol.

— Posso sair da mesa? — indagou o menino
— Termina de comer primeiro! – retrucou o pai
— Mas eu já terminei de comer!
— E essa salada no seu prato? Não vai comer não?
— É beterraba!
— E daí?
— E daí que beterraba é cor de rosa e cor de rosa é cor de menina!


E saiu da mesa.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Animus Muro Anima

Estranho Muro Natural
Diferente Muro Igual
Certo Muro Imoral
Muro Muro Muro
.
.
.

Encontrei uma Porta

domingo, 29 de setembro de 2013

Passarinho Verde

Embora educada, Ana nunca fora considerada uma grande simpatia, não que fosse antipática, mas não se interessava por grandes integrações sociais, nunca participava das festas e nem dos happy hours e, por isso, era sempre o assunto desses eventos. Chegava todos os dias em seu trabalho e por educação dava um breve “Bom dia” aos seus companheiros de trabalho e começava a trabalhar. Sempre muito técnica, se envolvia com seus projetos analíticos e não conversava com ninguém, somente se fosse extremamente necessário. Seus companheiros de trabalho achavam-na estranha e em conversas paralelas sempre chegavam à conclusão de que Ana não era normal.


Certo dia, ao chegar ao escritório, Ana cumprimentou seus companheiros de trabalho com o costumeiro “Bom dia” e deu um rápido sorriso. Seus companheiros se entreolhavam e acharam estranha sua atitude e entre um cochicho e outro, Ana ouvia em meio ao barulho do departamento.

— O que aconteceu com ela? — indagou o curioso

— Não sei, mas ela está diferente, parece até mais bonita — retrucou o cafajeste

— Deve ter visto um passarinho verde — arrematou a indiscreta falando mais alto que todos.

Todos riram e Ana ouviu, corou e nada disse.

No dia seguinte, Ana sorriu ao dizer bom dia e ainda cantarolou durante o expediente.

— Esse tal passarinho verde deve ser um gato! — gritou a indiscreta

Todos riram e Ana ouviu, corou e nada disse.

No outro dia, Ana sorriu ao dizer bom dia, cantarolou durante o expediente e ainda penetrou em algumas conversas paralelas.

— Esse tal passarinho deve um espetáculo — gritou mais uma vez a indiscreta

E os dias se passaram, Ana permanecia diferente e os comentários continuavam, até que um dia, Ana chegou ao escritório mais radiante do que o nunca. Sorriu ao dizer bom dia, cantarolou durante o expediente, penetrou em algumas conversas paralelas e ainda chamou seus companheiros para tomarem uma cerveja.  

A corajosa, que não se aguentava ,falou dessa vez mais alto do que nunca:

— Mas esse passarinho verde deve ser, alto, loiro, bonito e rico!

Antes de todos começarem a rir, Ana ouviu, corou e disse:

— Melhor! Descobri que o tal do passarinho verde nada mais é que um urubu preto, feio e sem a menor graça.

Todos ouviram, coraram e nada disseram.


E depois disso, Ana nunca mais ouviu nenhum comentário aviário.

Vamos?

Vamos?

Deixa estar
Deixa a vida levar
Deixa e vamos!

No final..
Quando a gente chegar a algum lugar...

Ou

Quando a gente não chegar a lugar algum
A gente vê o que faz


Mas fomos...

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Duzentos Gramas

Os dias de Mariana naquela cidadezinha ao sudoeste de lugar nenhum seguiam normalmente sem novidades:

Pela manhã estudava, o que julgara muito importante, pois devido à falta de opções que aquela cidade oferecia, decidira que, quando crescesse, lecionaria na escola de apenas uma sala do lado da igreja.

Ao chegar, almoçava e ajudava sua mãe nos afazeres domésticos, que não eram muitos, já que moravam num casebre de 50 metros quadrados.

Ao entardecer, era hora de ir ao mercadinho, também ao lado da igreja, para comprar os ingredientes para o jantar. Dona Tereza, a matriarca, acreditava que comprando as coisas todos os dias teria produtos mais frescos, mesmo sabendo que o tal mercadinho só repunha os produtos das prateleiras uma vez por semana.

Após o jantar lavava a louça, banhava seus três irmãos menores e os punha para dormir. Depois sentava-se no degrau da porta da sala e lia os livros emprestados por sua professora, enquanto sua mãe fazia companhia ao seu pai, recém-chegado do trabalho, frente à televisão. Depois de ler alguns capítulos do livro, retirava-se para dormir e no dia seguinte tudo recomeçava ciclicamente.

Certa tarde, ao chegar ao mercadinho para suas compras diárias, avistara um rosto não familiar atrás balcão:

- Duzentos gramas de muçarela, por favor – disse ela.
- Nossa, que raridade!
- Comprar muçarela?
- Não! Falar duzentos gramas. Todo mundo fala duzentas.
Ela assentiu sorrindo e ele sorriu em retribuição.
- Você não é daqui, não é mesmo?
- Não, cheguei faz dois dias. Vi uma placa de emprego e resolvi trabalhar aqui.
- Tá passando uns tempos?
- É. Ainda não sabemos quanto tempo. Meu pai foi transferido pra cá, mas não sei até quando.
- Entendo. Bem, nos vemos por aí. Até mais.
- Você não vai levar a muçarela?
- Ah é verdade. Obrigado.
- Prazer, Rodrigo.
- Prazer, Mariana.

Mariana virou-se sem olhar para trás, pagou suas compras e foi embora encantada com distinto moço. Chegando em casa, enquanto sua mãe tirava as coisas da sacola ela contava sobre o novo morador da região:

- Ele é bonito?
- É lindo mãe. Tem um sorriso igual de artista. Os olhos azuis que nem uma piscina – disse enquanto sua mãe olhava o pacote de queijo.
- Quem pediu muçarela?
- Fui eu, vou fazer uma... – pensou. Uma torta.
O resto do dia passou como de costume. No dia seguinte, enquanto almoçavam:
- Já fez sua lista de hoje mãe?
- Mas agente ainda está almoçando Mariana. Já tá pensando na janta?
- É pra adiantar o serviço, né mãe!
- Sei. Se eu não te conhecesse eu te comprava Mariana. Você está é querendo ir lá ver o tal do moço do olho de piscina.

Ela sorriu e não respondeu. Mariana não tinha muitas amigas e essas tardes em que passavam juntas criou entre elas uma cumplicidade mais do que de mãe e filha. Elas terminaram de almoçar e enquanto Mariana lavava a louça sua mãe fazia a lista diária.

- Mãe, coloca duzentos gramas de muçarela na lista.
- Aquela muçarela está na geladeira ainda.
- Mas é que...eu.. – gaguejou.
- Já entendi. Então compra só cem gramas.
- Tem que ser duzentos. Ele adora o jeito que eu falo duzentos – e saiu sorrindo.

Chegando ao mercadinho:

- Boa tarde! – disse ela.
- Tarde! – sorriu ele.
- Me dê du-zen-tos gramas de muçarela – disse pausadamente.
- É pra já!
- Seu pai trabalha nessa obra de escavação de petróleo?
- Trabalha.
- Eles estão atrapalhando meu pai.
- Por que?
- Meu pai é pescador, essa escavação está espantando os peixes da região.
- Desculpe. Não vai ser por muito tempo. Daqui a pouco meu pai tem que ir para outro lugar.
- Se seu pai trabalha nessa empresa. Por que você trabalha num mercadinho?
- Não quero passar o resto da minha vida acompanhando meu pai.
- O que você quer fazer da vida?
- Ainda não sei. E você?
- Eu vou ser professora. Não tem muita coisa pra fazer por aqui.
- Então por que você não vai embora?
- Pra onde?
- Sei lá, pega uma mochila e cai no mundo.
- Não é tão fácil assim.
- Basta você querer.

A frase dele a assustou:

- Tenho que ir. Tchau.
- Tchau.

E os dias foram se passando. Ele do lado de dentro do balcão e ela do lado de fora. Enquanto ele fatiava a peça de muçarela eles conversavam.
Ele nascido em São Paulo, viaja o Brasil com sua família acompanhado seu pai que trabalhava com escavação de petróleo. Hoje aos dezesseis anos, sonhava em viver num lugar fixo.

Ela, aos quinze, filha de pescador, nunca saíra da cidade onde nascera e provavelmente nem sairia. A única coisa que sabia sobre o mundo é o que via na televisão.

Certa tarde, ao chegar ao mercadinho não viu rodrigo atrás do balcão. Em seu lugar estava Seu Manoel, o dono do mercadinho. Um português de meia idade de bigodes compridos e brancos:
- Pois não senhorita?
- Cadê o Rodrigo, Seu Manoel?
- Me deixaste na mão o garoto. Foste embora. O que vai querer?

A pergunta ecoou em sua cabeça. Ela hesitou um momento e então respondeu:

- Me dê duzentos gramas de queijo prato!

sábado, 2 de outubro de 2010

Pobre homem de lata...

“E o homem de lata só foi em busca de um coração por não saber o trabalho que ele dava”